o vazio intrínseco (e inevitável?)

Juliana Keiko Hayashi
3 min readNov 22, 2020
cena do filme Pai e Filha de Ozu

Já existem muitos filósofos e filosofias falando sobre o vazio. Na arte também é um tema recorrente.

Mas aqui eu vou falar sobre a minha experiência com o vazio.

A nossa busca é pela completude, em qualquer ato, decisão, caminho que decidimos. mesmo que não entendamos nada sobre isso, mesmo que nunca paremos para pensar sobre o vazio.

a todo instante evitamos o encontro com o vazio, o sentir-se vazio, estar-se só, estando-se realmente só ou estando cercada de pessoas. hoje se fala continuamente sobre encontrar seu propósito. e se não tivermos nenhum propósito? e se o propósito maior seja simplesmente sermos capazes de existir, sentir, suportar o vazio inerente da existência nos entre-espaços de completude? e se pararmos de correr atrás de algo ou alguém que supomos (mesmo irrefletidamente) que nos preencha esse vazio? e se simplesmente pararmos, ficarmos e sentirmos esse vazio? o que nos acontecerá? o que vem depois de sentir o vazio sem fugir dele? sobreviveremos? qual o medo mais profundo que nutrimos ao evitar o confronto com o vazio?

atualmente vejo muita gente falando sobre relacionamentos, sobre como ter uma vida melhor, acho tudo isso válido. nunca antes foi tão se falado sobre auto-conhecimento e diversas maneiras de se falar sobre para todo tipo de gente poder se encontrar. mas como falar sobre projeção, liberdade e necessidade de controle, relação abusiva ou igualitária, ciúme e respeito, felicidade e angústia, sem antes criarmos uma relação conosco mesmo, de auto-observação, auto-investigação, auto-sentir, num processo cada vez mais independente da lente que o outro tem de nós, do que representamos para o outro, para a família, a sociedade.

todo mundo quer ser mais livre. buscamos a liberdade e autonomia, mas ela tem um custo alto. somos capazes de nos responsabilizar por nós mesmo em tudo que nos ocorrer? somos capazes de sentir e suportar o vazio que nos persegue?

se isso te assusta, bem-vindo ao clube. é realmente assustador. não faz parte das nossas racionalizações, tão comuns na nossa sociedade, em que todas as emoções e sentimentos podem ser explicados, e tudo bem entendermos nossas emoções e sentimentos cada vez mais, meu processo também é esse. mas acredito sobretudo, que esse processo precise ser vivenciado. e constantemente sermos capazes de nos questionar: o quanto permito que esse vazio penetre na minha vida? faço coisas somente para evitá-lo? estou com pessoas para não senti-lo? minhas decisões estão pautadas no confronto ou na fuga do vazio?

não prego uma vida melancólica e solitária, apesar de que alguns períodos de melancolia e solidão fazem bem para a alma. mas no ritmo que vivemos pouco espaço criamos para isso.

olhando para trás percebo que muitas das minhas decisões na vida foram feitas ou postergadas para evitar esse vazio, dessa maneira não fui verdadeira comigo mesma.

isso me faz pensar que esse vazio difícil de ser sentido, contém algo especial, que não deve ser ignorado. sinto que nele há alguma força oculta que acessamos dentro de nós mesmo quando permitimos que ele nos faça companhia.

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